Breno Rodrigo de Messias Leite e Rodolfo Silva Marques
Publicado no GGN
O recente processo eleitoral representa um marco histórico no Amazonas. As forças políticas em disputa interagem em um jogo incerto de interesses multivariados que envolvem atores políticos municipais, estaduais, nacionais e até internacionais. Ou seja, tanto as forças políticas nacionais quanto as locais travam pequenas batalhas nas suas respectivas trincheiras para a conquista dos corações, mentes e votos dos eleitores.
As eleições de 2022 no Amazonas sinalizam uma mudança de identidade política no interior de sua elite política local: a substituição da elite política forjada no esteio da redemocratização brasileira para outra nascida na ascensão disruptiva do bolsonarismo em 2018 (como afirmam os autores Jairo Nicolau ou Maurício Moura e Juliano Corbellini em livros que refletem sobre as últimas eleições). É óbvio que a perspectiva dos analistas só pode ser endossada pela verdadeira fonte da soberania, o cidadão-eleitor.
Assim, o objetivo da análise do cenário eleitoral no Amazonas é, primeiramente, identificar os grupos políticos – os blocos de poder – em disputa. Em segundo lugar, identificar os principais atores que lutam por uma vaga para o governo do Amazonas e as suas relações com os principais presidenciáveis. E, por fim, examinar as candidaturas para escolha do senador da República.
Antes de entrarmos na arena eleitoral do presente ano, partamos, pois, do status quo ante. A política eleitoral do Amazonas foi profundamente impactada pelas forças do bolsonarismo, por ocasião da vitória de Jair Bolsonaro (então no já extinto PSL) para a Presidência da República, em 2018. Os efeitos do bolsonarismo e as demandas por renovação da classe política convergiram, o que garantiu a vitória de Wilson Lima para o governo do estado (neófito na política e, à época, filiado ao PSC), eleito com 596.585 (33,73%), e que impôs uma dura derrota ao ex-governador Amazonino Mendes (PDT), que obteve 579.016 (32,74%) dos votos válidos.
O candidato vitorioso nunca foi uma liderança política estadual. O santareno Wilson Lima é jornalista e era apresentador do programa Alô Amazonas, da TV A Crítica, do grupo de comunicação ligado à família Calderaro. A popularidade do programa de meio-dia e o patrocínio de seus patrões fizeram com que o apresentador, já bastante conhecido em Manaus e nas demais cidades do interior do Amazonas, pudesse se transformar em um candidato eleitoralmente competitivo. Mesmo sem pertencer organicamente às bases ou vocalizar uma adesão ideológica ao bolsonarismo, Lima conseguiu surfar na onda disruptiva provocada pelo presidente da República eleito, em um típico jogo de ganha-ganha.
Quatro anos depois, eis que estamos nas eleições de 2022. E o que temos são três blocos eleitoralmente competitivos para as eleições majoritárias.
Wilson Lima, o candidato à reeleição e hoje filiado ao União Brasil (UB), lidera ampla coligação formada por dez partidos. A composição multipartidária conta com a aliança de partidos de direita e de centro-direita. A gestão de Wilson Lima foi marcada pela crise da falta de oxigênio hospitalar no período de agravamento da pandemia. Hoje, o seu nome lidera as pesquisas dos principais institutos. A relação de Wilson Lima com o presidente da República e candidato à reeleição é de equidistância pragmática. Jair Bolsonaro (hoje, no PL) não o apoia explicitamente, mas tampouco o rejeita como um aliado em potencial. Afinal, o presidente Jair Bolsonaro precisa de um palanque abrangente e da logística eleitoral do governador (em muitos casos, efetivo controle de prefeitos) para interiorizar a comunicação de sua campanha.
Amazonino Mendes, hoje no Cidadania e governador do Amazonas por vários mandatos (1987-1990; 1995-1998; 1999-2002; e 2017-2018), está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto. Sua candidatura faz parte de uma federação partidária composta por PSDB e Cidadania. Como os tucanos, nacionalmente, apoiam a candidatura de Simone Tebet (MDB), Amazonino ficou sem um robusto aliado de projeção nacional. Tal ausência, para Amazonino, por ser um político de perfil mais paroquial, pode não ser uma preocupação para o veterano.
Eduardo Braga, senador da República pelo MDB e governador do Amazonas por dois mandatos (2003-2006 e 2007-2010), está em terceiro lugar nas pesquisas e faz parte da coligação Em Defesa da Vida, que conta com partidos dos mais diferentes espectros ideológicos. A aliança Braga-Lula (PT) é histórica e foi iniciada em 2003, quando ambos foram eleitos pela primeira vez para os seus respectivos cargos. Eduardo Braga foi ministro da presidente Dilma Rousseff e realinhou-se ao PT junto com a ala lulista do MDB.
Quanto às candidaturas para o Senado Federal, podemos destacar quatro eleitoralmente competitivas, a saber: coronel Menezes, Luiz Castro, Omar Aziz, Arthur Virgílio Neto.
Coronel Menezes, companheiro de armas nas FFAA, foi apadrinhado pelo presidente Jair Bolsonaro ao indicá-lo para a superintendência da Suframa, em 2019. Licenciado do cargo, candidatou-se para a Prefeitura de Manaus, em 2020. Coronel Menezes é, certamente, o nome do palanque de Bolsonaro para o Amazonas. Nesta eleição de 2022 lidera as forças bolsonaristas no Estado.
Luiz Castro, do PDT, por sua vez, é um aliado de Ciro Gomes e da candidata ao governo, Carol Braz.
Omar Aziz, do PSD, é o nome de Lula para o Senado. Ex-governador do Amazonas (2011-2014), Omar foi peça importante como presidente da CPI da Pandemia no Senado, em 2021. Omar é aliado de Eduardo Braga de longa data. A tríade Lula-Braga-Aziz forma o palanque do centro-esquerda no Amazonas.
Por fim, Arthur Virgílio Neto, ex-prefeito de Manaus (1989-1992, 2013-2016 e 2017-2020) e ex-senador da República (2003-2010), lança seu nome para mais uma corrida eleitoral. Para esta eleição, aproximou-se de um rival histórico, Amazonino Mendes, candidato ao governo do Amazonas, e mantém uma relação equidistante em relação à presidenciável Simone Tebet, do MDB. A aliança Virgílio Neto-Amazonino parece valorizar mais a dinâmica política local, sem grandes inserções ou interesses na política nacional.
Resumidamente, podemos ter em mente que a competição eleitoral deste ano pode representar uma virada de chave na política amazonense. Afinal, novas lideranças surgem eleitoralmente competitivas e as antigas já se encontram, de fato, eleitoralmente bastante deterioradas. A renovação dos nomes, contudo, não significa, necessariamente, uma mudança de mentalidades ou de práticas.
Pelo contrário, há um certo continuísmo nas agendas e nas preocupações paroquiais dos candidatos em disputa. A eleição do próximo dia 2de outubro pode confirmar – ou não – nossas perspectivas e cenários apresentados.
Breno Rodrigo de Messias Leite é cientista político, professor do Instituto Amazônico de Ensino Superior (IAMES) e do Diplô Manaus. E-mail: [email protected].
Rodolfo Silva Marques é cientista político, professor-doutor da Universidade da Amazônia (UNAMA) e da Faculdade de Estudos Avançados do Pará (FEAPA). É colunista de política da CBN Amazônia Belém e do portal oliberal.com. E-mail: [email protected].