Leonardo Avritzer

Publicado no Pulso

O resultado do primeiro turno das eleições de 2022 mostra um comportamento contraditório por parte do eleitorado brasileiro. Em primeiro lugar, não podemos deixar de destacar, tal como mostram os mapas abaixo, que houve um grande crescimento no número de votos, em determinadas regiões e estados, do candidato a presidente do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, quando comparamos os resultados do primeiro turno dessas eleições com o de 2018.

 

Como podemos observar nos mapas, o PT, por meio da candidatura de Lula, retomou a hegemonia na região Norte do país e também conseguiu ampliar sua hegemonia no Nordeste a partir de uma vitória muito significativa no estado do Ceará. Por fim, obteve a liderança em Minas Gerais, estado da região Sudeste no qual Fernando Haddad (PT) teve seu melhor resultado em 2018, mas que ainda assim não foi suficiente ganhar do então candidato Jair Bolsonaro (PL).

O mapa eleitoral de 2022 mostra o retorno do mapa vitorioso do Partido dos Trabalhadores entre 2006 e 2014. As eleições no Brasil tiveram duas dinâmicas em nossa redemocratização. A primeira, que prevaleceu nas eleições de 1989, 1994, 1998 e 2002, foi a dos candidatos vencedores realizarem fortes maiorias em quase todos os estados. Foi assim com Fernando Collor, Fernando Henrique e foi assim com a primeira eleição do ex-presidente Lula. No entanto, desde 2006 anunciou-se uma nova dinâmica, na qual há um país bem mais dividido e com certo avanço do conservadorismo, em especial nas regiões Sul e Centro-Oeste do Brasil. Na eleição de 16 anos atrás, o PT venceu exatamente com o mapa que apontamos acima, que é o mesmo das disputa de 2022 com exceção do Rio Grande do Sul.

 

Uma das boas notícias para os eleitores do presidente Lula é a retomada da competitividade do PT no Rio Grande do Sul, onde, tal como mostra o mapa dois abaixo, o candidato do PT foi vencedor em toda parte Sul do estado e mostrou-se competitivo nas demais regiões. 

Temos também questões que nos preocupam em relação aos resultados do primeiro turno e que acendem sinais amarelos em relação ao resultado final da eleição que ocorrerá no dia 30 de outubro. O primeiro diz respeito a um certo avanço das bancadas conservadoras na Câmara. Especialmente de um movimento, tanto na Câmara quanto no Senado, da centro-direita para a extrema-direita.

 

Principalmente no Senado, a vitória das candidaturas de Sergio Moro, Marcos Pontes, Damares Alves e Hamilton Morão apontam na direção de um Senado ainda mais conservador que pode potencialmente vir a se tornar um obstáculo à governabilidade, ainda que existam movimentos na outra direção, com as vitórias de quatro senadores pelo PT no Pará, Ceará, Pernambuco e no Piauí, além das vitórias de Flávio Dino, pelo PSB, no Maranhão e de Renan Calheiros, parte da coalização de apoio ao ex-presidente Lula, no estado do Alagoas. Assim, temos um Senado mais à direita pela vitória dos candidatos da extrema-direita em relação aos senadores da centro-direita que perderam os seus mandatos. Nesse sentido temos uma movimentação da centro-direita para a extrema-direita

 

Por fim, é importante ressaltar que houve uma mudança no padrão eleitoral nas grandes cidades brasileiras. O gráfico abaixo, elaborado por Fernando Meireles, ex-aluno da UFMG e atual pesquisador do Cebrap, , aponta muito claramente para dois fenômenos que são importantes. De um lado, mostra que houve um aumento de apoio a Bolsonaro em pequenas cidades do Brasil, especialmente em nas com população abaixo de 50 mil habitantes. No entanto, o fenômeno mais importante e que provavelmente vai selar uma dinâmica na opinião pública é o grande avanço da candidatura do Lula nas grandes cidades, principalmente nas principais capitais. Nesse caso, o que percebemos é que a diminuição de apoio a Bolsonaro nas capitais e nas grandes cidades brasileiras, que começou na pandemia, se acentuou. É muito difícil que o presidente possa revertê-la nesse segundo turno das eleições.

 

As eleições terminam com um cenário incerto mais fortemente positivo para a candidatura que ocupou o primeiro lugar no primeiro turno das eleições. Esse quadro se dá em relação a três situações principais. Em primeiro lugar, há uma consolidação do apoio ao presidente Lula na região Nordeste; em segundo, há uma reversão da perda de apoio eleitoral do PT na região Norte, durante as eleições de 2018; e, em terceiro, ocorre uma recuperação parcial do PT por meio da candidatura do ex-presidente Lula nos três principais colégios eleitorais da região Sudeste.

 

Em Minas Gerais, Lula obteve um desempenho altamente positivo ganhando a eleição, independentemente da alta porcentagem de votos do governador Romeu Zema. Nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, ainda que Bolsonaro tenha vencido as eleições, ele ganhou com percentuais muito inferiores aos que teve em 2018.

 

Assim, a perspectiva do segundo turno é uma consolidação do ex-presidente Lula em todas essas regiões mencionadas e um possível fortalecimento de sua candidatura em algumas cidades e estados do país. Há ainda estados nos quais se anuncia a possibilidade de uma reversão da vitória do presidente Jair Bolsonaro. Em primeiro lugar, o Rio Grande do Sul, onde a candidatura do ex-governador Eduardo Leite do PSDB precisará de um apoio do PT para se tornar vitoriosa. Em segundo lugar, existe a forte possibilidade que o apoio por parte de Simone Tebet melhore significativamente o desempenho do Lula na região centro oeste. Assim, ainda que o desempenho de Jair Bolsonaro tenha sido acima do esperado, em especial no estado de São Paulo, nada indica que se trate de uma tendência que irá continuar no segundo turno.