Eleições 2022 em Goiás como espelho das eleições 2018

Eleições 2022 em Goiás como espelho das eleições 2018

Robert Bonifácio e Denise Paiva*

Publicado no GGN

 

As eleições de 2022 em Goiás estão, até agora, parecidas com o que se apresentava em igual período nas eleições de 2018. Em ambos os contextos: (i) Ronaldo Caiado (antes do DEM, agora no União Brasil), rouba a cena na disputa para governador, deixando os oponentes para trás no primeiro turno; (ii) Bolsonaro encontra-se à frente do candidato petista à Presidência da República e (iii) a polarização nacional não ecoa na disputa eleitoral para governador. 

 

Caiado disparado na frente

 

Em 2018, a conjuntura estava muito favorável para Caiado. Ele conseguiu dividir o hoje MDB a partir de dois movimentos: promoveu indiretamente uma “guerra” entre o então (e atual) presidente regional do partido, Daniel Vilela, e fortes lideranças locais, como os prefeitos Adib Elias (Catalão) e Renato Castro (Goianésia). Além disso, induziu uma tímida participação de Iris Rezende (1933- 2021), então prefeito de Goiânia, naquela campanha eleitoral. Por fim, Caiado se favoreceu com o desgaste da hegemonia de duas décadas do PSDB estadual e com a prisão preventiva de Marconi Perillo, maior líder regional do partido, às vésperas daquela eleição.

 

Agora, em 2022, Caiado conseguiu atrair Vilela para ser seu candidato a vice-governador, o que pacifica o MDB e lhe confere mais musculatura política, tanto na capital quanto no interior. O PSDB teve muitas dificuldades e não apresentou uma candidatura a governador. Surgiu um novo oponente ao atual governador, Gustavo Mendanha (antes MDB, agora Patriotas), que tinha boas perspectivas, mas se equivocou por completo na articulação política. Mendanha foi eleito prefeito de Aparecida de Goiânia em 2016 (no primeiro turno) com apoio de Maguito Vilela, a quem sucedeu, e foi reeleito em 2020 no primeiro turno com 98% dos votos válidos. Após discordar de Daniel Vilela (presidente do MDB regional), em função da aliança com Ronaldo Caiado, e por querer concorrer ao executivo estadual, acabou se desfiliando do MDB e filiou-se ao Patriotas para concorrer a governador.

 

Mendanha foi alvo de uma ação política atabalhoada de Caiado às vésperas da sua reeleição como prefeito do segundo maior colégio eleitoral de Goiás, Aparecida de Goiânia, situada na região metropolitana. O governador acionou o aparato policial e foi até um posto de gasolina acusar Mendanha de comprar votos, mesmo sem ter provas para tanto. Além disso, o ex-prefeito é jovem e poderia se apresentar como novidade na disputa eleitoral. No entanto, seu arco de alianças é modesto, o que não lhe provê recursos financeiros nem tempo de rádio e TV suficientes e tampouco apoios robustos no interior do estado. Para piorar, declarou-se bolsonarista, mas o namoro não foi correspondido: o presidente da República apoia outro candidato a governador,  o deputado federal Major Vitor Hugo (PL), seu fiel aliado. 

 

Toda essa conjunção de acontecimentos deixa Caiado, em agosto de 2022 (48%), em situação similar à que estava em setembro de 2018 (47%), considerando resultados de pesquisa de intenção de voto do IBOPE e do IPEC, respectivamente (ver Gráficos 1 e 2 abaixo). Em 2018, Caiado foi eleito em primeiro turno com 59,73% dos votos e, caso a conjuntura não se altere, a eleição deste ano tende a ter um desfecho idêntico ao de 2018. 

 

Gráfico 1 – Intenções de voto para governador de Goiás – Setembro 2018

 

Gráfico 2 – Intenções de voto para governador de Goiás – Agosto 2022

 

Fonte: Ipec

 

Bolsonaro à frente de petistas 

 

É comum em Goiás que candidatos de direita (moderada ou radical) à Presidência da República levem vantagem sobre candidatos petistas. Durante as últimas cinco eleições, candidatos da direita ganharam 6 de 10 turnos em disputa no estado, conforme ilustra a Tabela 1. A maior diferença de votos deu-se na eleição mais recente, o segundo turno de 2018, quando Bolsonaro (então PSL) teve 30% a mais de votos válidos do que Haddad (PT). 

Tabela 1 – Resultados eleitorais dos dois primeiros colocados nas eleições presidenciais em Goiás (2002-2018)

 

2002 2006 2010 2014 2018
PT 42,1 57,1 40,1 54,8 42,2 49,3 31,6 42,4 21,9 35,5
PSDB/PSL 27,9 42,9 51,5 45,2 39,5 50,7 41,6 57,6 57,2 65,5

Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

*Candidatos do PT: Lula em 2002 e 2006; Dilma em 2010 e 2014; Haddad em 2018.

*Candidatos do PSDB: Serra em 2002 e 2010; Alckmin em 2006; Aécio Neves em 2014.

*Candidato do PSL: Bolsonaro em 2018.

 

Em setembro de 2018, a disputa eleitoral para a Presidência da República em Goiás indicava liderança de Bolsonaro (35%), a segunda posição para Haddad (15%) e grande pulverização de votos entre os demais candidatos (35% no total), conforme mostra o Gráfico 3. A disputa em agosto de 2022 (Gráfico 4) é similar em relação à ordem de predileção dos eleitores goianos: mais uma vez, Bolsonaro (PL) se mostra à frente do candidato petista, alcançando 39% das intenções de voto, ante a 34% de Lula, embora ambos estejam em situação de empate técnico, considerando a margem de erro. Por outro lado, as intenções de voto nos demais candidatos se mostra menor, abarcando somente 13%. Certamente não é possível cravar qual candidato terá mais votos no primeiro turno para presidente em Goiás, ao contrário de 2018, mas o cenário atual guarda relação com aquele de quatro anos atrás.   

 

Gráfico 3 – Intenções de voto para presidente em Goiás – Setembro 2018

Fonte: IBOPE

 

Gráfico 4 – Intenções de voto para presidente em Goiás – Agosto 2022

Fonte: Ipec

 

Predomínio da lógica regional na eleição para governador 

 

Um cidadão não tão bem informado ou interessado na política goiana talvez se assuste ao ter contato com as intenções de voto na disputa para governador. É porque ela não segue – há décadas – o mesmo sentido da disputa nacional, ao contrário do que usualmente se observa nos cinco maiores colégios eleitorais do país – São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul. 

 

Em 2022, esse cenário se mostra ainda mais perceptível. Caiado adotou uma postura reticente e não comenta sobre a eleição presidencial. Isso se deve à relação azeda com Bolsonaro, uma vez que este apoia o deputado Major Victor Hugo, e ao fato de que o atual governador divide com Lula boa parte do eleitorado, por incrível que pareça. Logo, falar de eleição presidencial é assunto proibido no Palácio das Esmeraldas. Some-se a isso o fato de o candidato bolsonarista não alcançar sequer dois dígitos e o candidato petista, Wolmir Amado, sequer alcançar 1% de intenção de voto na pesquisa IPEC acima referida. 

 

Durante décadas, a disputa pelo poder executivo estadual gravitou entre PMDB e PSDB. Caiado desconstruiu essa dinâmica de poder em 2018, mas o fez sem alterar uma das lógicas da disputa, isto é, sem adicionar qualquer ingrediente de alcance nacional. Goiás continua olhando somente para si para decidir sobre quem governa o estado.  

 

Robert Bonifácio é doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais e professor da Universidade Federal de Goiás.

Denise Paiva é doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e professora titular aposentada da Universidade Federal de Goiás.