O cenário eleitoral aponta para forte ameaça à aliança PSB/PT em Pernambuco

O cenário eleitoral aponta para forte ameaça à aliança PSB/PT em Pernambuco

Manoel Leonardo Santos e 

Ernani Carvalho

 

No último dia 21 de julho, com a presença de Lula em ato no Recife, a aliança histórica entre PSB/PT em Pernambuco foi vaiada. Esse fato pode ser interpretado como o prenúncio de que nessa eleição tudo pode ser diferente.  A cúpula do PSB, formada por políticos como o prefeito de Recife, João Campos, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara, e o próprio Danilo Cabral (candidato a governador pelo partido) tiveram os nomes apupados. Também foi vaiado durante sua fala o senador Humberto Costa (PT), um dos principais artífices da aliança por parte do PT. A pesquisa realizada pelo Ipec/TV Globo entre 12 e 14 de agosto ** parece confirmar essa tendência.

A pesquisa revela um quadro marcado por dois pontos principais: um possível descompasso entre o voto para governador em Pernambuco e o voto para presidente, e uma ameaça ao PSB, que não perde no estado desde 2006. Explico. Embora a chapa formada por Lula (PT) e Alckmin (PSB) conte com 63% das intenções de voto no estado, uma vantagem considerável sobre Bolsonaro, com apenas 22%, seu apoio à aliança PSB/PT parece não convencer a maioria de seus eleitores. Isso fica claro nas intenções de voto captadas pela pesquisa. A candidata Marília Arraes (Solidariedade) lidera a disputa com 33% no primeiro turno, já o candidato Danilo Cabral, da aliança PSB/PT, aparece com apenas 6%, posicionado  em quinto lugar na corrida eleitoral (gráfico 1).

 

Cabral está a nada menos que 27 pontos percentuais de distância de Marília, e esse não é seu único desafio. Entre ele e Marília aparecem Raquel Lyra (PSDB) com 11%, Anderson Ferreira (PL) com 10% e Miguel Coelho (União Brasil) com 9%, tecnicamente empatados. Danilo aparece, ainda, tecnicamente empatado com os candidatos com 1% de intenção de votos. Esse quadro denota uma grande singularidade, se trata da eleição mais disputada da história política do estado.

Contudo, como 9% dos eleitores não responderam ou ainda não sabem em quem vai votar e o fato da campanha estar apenas começando, esse cenário pode mudar. Pelo que se pode observar, tudo indica que teremos segundo turno em Pernambuco e, se confirmada a preferência do eleitor por Marília, qualquer um dos quatro candidatos que a seguem estão aptos, probabilisticamente falando, a passar para o confronto final. Portanto, a incerteza ainda é grande e qualquer palpite neste momento é passível de contestação.

Tudo depende de muitas variáveis mas ao que aparece, prima facie, fator decisivo será a combinação da eleição para o Senado e o cenário nacional.

A disputa para o Senado e o cenário nacional

A disputa para o Senado aponta quatro candidatos com bom desempenho. Em primeiro lugar vem André de Paula (PSD), com 14% das intenções de voto, em segundo a deputada estadual Tereza Leitão (PT) com 12%, seguida por Guilherme Coelho (PSDB) com 9% e o ex-ministro do governo Bolsonaro Gilson Machado (PL), que possui 7%. Como a margem de erro da pesquisa é de três pontos percentuais, a disputa para o cargo de senador/a ainda está em aberto, mostrando um cenário de empate técnico entre os três principais candidatos.

 

Considerando que o percentual dos que declararam que não sabem em quem vão votar e os eleitores que não responderam ainda é bastante alto, 19%, pode-se dizer que a disputa não está, nem de longe, definida. Isso porque os quatro candidatos mais bem posicionados ao Senado têm seus trunfos e, se souberem usá-los, podem realmente mudar o rumo das eleições. Inclusive mudar o resultado da eleição para governador, por mais contraintuitivo que isso pareça. 

Tereza Leitão é a representante legítima de Lula em Pernambuco e, portanto, pode se beneficiar muito do desempenho dele no estado. Ela pode alavancar tanto a sua candidatura quanto a de Danilo Cabral. Ela é a “ponte” entre Lula e Danilo Cabral que, como vimos, não vem tendo bom desempenho nas pesquisas. Assim, Danilo pode se beneficiar mais de Tereza do que o contrário. Sensato seria, portanto, colocar a máquina a favor da candidata, principalmente no interior. Desde que ela traga, claro, Lula para fazer campanha em Pernambuco.

Gilson Machado traz consigo o nome do Bolsonaro, que embora tenha apenas 22% em Pernambuco em 2022, vem melhorando nacionalmente, segundo pesquisas mais recentes. Considerando que o presidente vem encurtando a distância para Lula nacionalmente e, mais que isso, que ainda não contabilizou precisamente qual o tamanho do eleitorado que conquistou com o Auxílio Brasil de 600 reais. Imagina-se que com o Auxílio Brasil, somado à redução do preço dos combustíveis e a recente melhora nos indicadores econômicos, essa distância deve diminuir ainda mais. Se tudo der certo para Bolsonaro, Machado amplia exponencialmente seu potencial de crescimento, junto com Anderson Ferreira, contribuindo para levá-lo ao segundo turno. 

André de Paula, que compõe com Marilia Arraes, talvez possa atrair para a candidata uma fatia do eleitorado que ela não tem. Por se tratar de uma chapa ideologicamente bastante heterodoxa, de Paula pode trazer para Marília um voto de direita que ela dificilmente teria, dada sua trajetória política no PT. Posicionada, hoje, em primeiro lugar para o governo, ela pode ter sua posição consolidada, e até ampliada, com o apoio de André 

Por sua vez, a chapa puro-sangue do PSDB também pode agregar muito à candidatura da Raquel Lyra para governadora, ajudando-a a ir para o segundo turno. O ex-deputado federal Guilherme Coelho (PSDB), presidente do partido em Petrolina, traz a força de uma das regiões mais importantes do estado. Raquel, que já é bastante forte no Agreste (foi prefeita por duas vezes de Caruaru, cidade mais destacada da região), soma agora importante eleitorado do sertão. Além disso, ela conta ainda com a deputada estadual Priscila Krause (Cidadania) como vice na sua chapa. Priscila foi vereadora do Recife por três mandatos consecutivos. Seu bom desempenho eleitoral mostra que ela tem força na capital e, portanto, completa um quadro que sugere que Raquel Lyra pode ter bom desempenho do litoral ao sertão, e isso não é pouca coisa para uma candidata que é, reconhecidamente, um nome ainda regional.

Sabe-se que, historicamente, são os candidatos a governador que impulsionam a eleição de seus senadores, assim, parece estranho sugerir uma mudança na consolidada equação eleitoral. Mas, por mais contra intuitivo que possa parecer, as evidências apontam que é a eleição para o Senado que pode ser o fiel da balança. Especialmente porque a luta dos candidatos posicionados depois de Marília Arraes se resume, pelo menos nesse momento, a levar a eleição para o segundo turno. E a briga, de fato, está bastante equilibrada. Os candidatos ao Senado, cada um à sua maneira, podem agregar uma parcela de votos para o seu governador que não será desprezível nesse contexto. Ao contrário, eles podem ser decisivos para prolongar a disputa e, quem sabe, virar o jogo que, nesse momento, parece favorecer a desafiante principal da aliança PSB/PT, Marília Arraes.

Provavelmente a polarização política no nível nacional será decisiva, assumindo resultados distintos nas eleições majoritárias do estado. Se para o Senado o efeito da polarização será genuíno e direto, ou seja, tende a beneficiar Teresa Leitão (com os votos de Lula) e Gilson Machado (com os votos de Bolsonaro), para o governo do estado o efeito será matizado, com Bolsonaro beneficiando Anderson Ferreira, e Marília Arraes sendo beneficiada com a ajuda indireta dos eleitores mais convictos do PT e de Lula.

Na espera de quem vai para o segundo turno e do resultado das eleições para o Senado, vale tão somente especular. Dado o racha na elite política pernambucana, que pode ser constatado pelo grande número de candidatos viáveis tanto para governador como para senador, tudo vai depender de como essa mesma elite política vai se reacomodar no segundo turno das eleições em Pernambuco.  

*Manoel Leonardo Santos  é Professor do departamento de ciência política da UFMG. Coordenador do centro de estudos legislativos e editor da revista Teoria e sociedade da UFMG.

**Ernani Carvalho é Doutor em Ciência Política pela USP, Pesquisador de Produtividade Nível 2 do CNPq, Professor Associado do Departamento de Ciência Política e Coordenador do Mestrado Profissional em Políticas Públicas da UFPE.