por Marta Mendes
Marta Mendes da Rocha, Luciana Santana e Gustavo Paravizo
Iniciadas a campanha eleitoral para escolha de novos governadores e governadoras e a realização de pesquisas de intenção de voto, já é possível ter uma ideia de em quais estados a disputa pode ser encerrada ainda no primeiro turno e onde ela está mais acirrada. Devido ao fato de as eleições estaduais e nacionais ocorrerem simultaneamente, a definição do resultado da eleição para governadores no primeiro turno pode ter importantes implicações para a corrida presidencial que, tudo indica, será decidida na segunda rodada.
Os eleitos e eleitas no primeiro turno poderão se dedicar integralmente à eleição de seu aliado na corrida presidencial. Isso pode ser particularmente importante nos grandes colégios eleitorais do país. Há também a possibilidade de que candidatos até agora reticentes em declararem apoio a Lula (PT) ou a Bolsonaro (PL), uma vez eleitos, sintam-se mais seguros para se posicionarem. Além disso, nos estados em que houver segundo turno é muito provável que a disputa para o governo estadual acabe reproduzindo de forma mais intensa a polarização nacional.
Disputas estaduais com chance de decisão no primeiro turno
Considerando as sondagens de opinião, observa-se que em 13 unidades federativas há chances da disputa se encerrar no primeiro turno: Acre, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima e Tocantins. Em onze deles os governadores tentam a reeleição. Analisamos a possibilidade de vitória no primeiro turno considerando a intenção de votos no candidato(a), com base nas pesquisas mais recentes do Ipec, divulgadas na segunda quinzena de agosto, e o quanto isso representaria em termos de votos válidos (excluindo-se brancos, nulos e indecisos).
Os candidatos melhor posicionados para encerrarem o jogo ainda na primeira rodada são ACM Neto (UB), na Bahia, com 69% das intenções de voto e Renato Casagrande (PSB), no Espírito Santo, com 68%. Em seguida aparecem Mauro Mendes (UB) no Mato Grosso com 63% e Helder Barbalho (MDB) no Pará com 62% (este último, segundo pesquisa do Instituto RealTime Big Data de final de julho). Ronaldo Caiado (UB), Ratinho Jr. (PSD) e Fátima Bezerra (PT) aparecem com 60% das intenções em Goiás, Paraná e Rio Grande do Norte, respectivamente. Com intenções de voto entre 50% e 60%, também com chances de serem eleitos no primeiro turno, aparecem Romeu Zema (Novo), em Minas Gerais, com 58% das intenções de voto, Antônio Denarium (PP), em Roraima, e Wanderlei Barbosa, no Tocantins, ambos com 52%, e Silvio Mendes (UB) e Gladson Cameli (PP), ambos com 51%, no Piauí e no Acre, respectivamente.
Esse cenário sinaliza a possibilidade de que, ao final do primeiro turno, o União Brasil, partido criado em 2021 da fusão entre o DEM e o PSL, eleja quatro governadores. Também sinaliza maior tendência de continuidade na região Centro-Oeste, já que os atuais governadores podem se reeleger no primeiro turno em três dos quatro estados da região, a exceção sendo o Mato Grosso do Sul. Vale destacar, também, a vantagem do ex-prefeito de Salvador ACM Neto (UB) na Bahia e de Romeu Zema (Novo) em Minas Gerais, dois dos maiores colégios eleitorais do país.
Disputas estaduais com chance de decisão no segundo turno
Em outros 14 estados, as pesquisas sugerem que a disputa será decidida no segundo turno: Alagoas, Amapá, Amazonas, Ceará, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe. Em sete estados os atuais governadores lideram a corrida e devem chegar ao segundo turno em vantagem, segundo as últimas pesquisas do Ipec. Contudo, isso não significa que eles terão vida fácil no caminho para uma possível reeleição.
Conforme apuramos, pelo menos cinco governadores eleitos em 2018 devem passar ao segundo turno se não com ampla dianteira, pelo menos com alguma folga (pelo menos 15 pontos de diferença em relação ao segundo colocado): João Azevedo (PSB), na Paraíba, com 40% das intenções de voto; Carlos Brandão (PSB), no Maranhão, com 39% dos votos válidos; Eduardo Leite (PSDB), no Rio Grande do Sul, com 43% (podendo se tornar o primeiro governador reeleito na história gaúcha). Também na liderança, mas com uma vantagem um pouco menor em relação ao segundo colocado aparecem o atual governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), com 40% dos votos válidos, e Carlos Moisés (Republicanos), em Santa Catarina, com 31%.
A disputa deve ser mais competitiva em pelo menos quatro estados. Em Rondônia, o atual governador Marcos Rocha (UB) e o senador e ex-governador Ivo Cassol (PP) estão empatados tecnicamente com 36% e 35% das intenções de voto, respectivamente. No Amazonas, o governador Wilson Lima (UB), e o ex-prefeito de Manaus e ex-governador, Amazonino Mendes (Cidadania), têm 35% dos votos válidos cada um. O cenário também é indefinido em Alagoas onde o governador Paulo Dantas (MDB) tem 30% e está tecnicamente empatado com Rodrigo Cunha (UB), com 27%. Apoios estratégicos têm deixado a competição política mais incerta no estado, sobretudo pelo endosso de Arthur Lira e Jair Bolsonaro às candidaturas desafiantes.
Em outros sete estados, as eleições ocorrem sem a presença dos atuais governadores na corrida. Apesar disso, muitos deles trabalham para garantir a vitória de sucessores. Ao mesmo tempo, grupos locais se mobilizam diante da possibilidade de alternância na política estadual. No Amapá, por exemplo, Clécio Luís (SD) conta com o apoio do governador, Waldez Góes (PDT), e aparece com 49%. Ele é seguido de perto por Jaime Nunes (PSD), com 42%. No Mato Grosso do Sul, o ex-governador André Puccinelli (MDB) tem 31% dos votos válidos contra 20% do ex-prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD) e 17,5% de Eduardo Riedel (PSDB), este último apoiado pelo governador, Reinaldo Azambuja.
Por fim, no Ceará, Capitão Wagner soma 40% e tem pequena vantagem sobre Roberto Cláudio (PDT), com 35%. Elmano de Freitas (PT), candidato respaldado pelo governador Camilo Santana (PT), depois de um atrito com o PDT de Ciro Gomes, é apenas o terceiro colocado. Já em Sergipe, Valmir de Francisquinho (PL) – que depende de decisão do TSE para seguir candidato – tem 42% dos válidos contra 23% de Fábio Mitidieri (PSD), que conta com o apoio do governador Belivaldo Chagas (PSD).
Entre os desafiantes que lideram as pesquisas, a situação mais confortável é a de Fernando Haddad (PT) em São Paulo, que registra 49% das intenções de voto e de Marília Arraes (SD), que abriu uma boa vantagem na última pesquisa e aparece agora com 42% dos votos válidos em Pernambuco.
Impactos sobre a corrida presidencial
Ainda há muita coisa para acontecer até o dia 2 de outubro, mas se o cenário acima se confirmar, quais são as implicações para a corrida presidencial e um provável segundo turno entre Lula e Bolsonaro? Dos treze candidatos que podem se eleger ainda no primeiro turno, cinco contam com o apoio ou apoiam oficialmente Bolsonaro contra dois que apoiam Lula. Quatro optaram por não se alinhar abertamente ou não foram bem sucedidos na conquista do apoio dos presidenciáveis. Romeu Zema já deu indícios de que pode se alinhar a Bolsonaro em um eventual segundo turno, o que daria uma importante vantagem para o candidato do PL em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país. Os candidatos que lideram as pesquisas na Bahia, no Piauí e em Goiás já sinalizaram que pretendem permanecer neutros. Apenas no Pará, Lula se beneficiaria da vitória de Barbalho no primeiro turno.
Nos estados com maiores chances de segundo turno, quatro das treze candidaturas que lideram as disputas para os governos estaduais estão alinhadas a Jair Bolsonaro já no primeiro turno, incluindo Claudio Castro no Rio de Janeiro, o terceiro maior colégio eleitoral do país. Em Santa Catarina, todos os candidatos competitivos oferecem palanque a Bolsonaro e em Rondônia, onde o presidente teve votações expressivas em 2018, há disputa judicial entre os candidatos pelo uso da imagem de Bolsonaro. Se os candidatos que lideram em Sergipe e no Ceará confirmarem sua presença no segundo turno, Bolsonaro ainda pode ganhar dois palanques fortes na região Nordeste. Uma situação peculiar é a de Clécio Luís (SD-AP) que recebe o apoio de Lula e Bolsonaro no Amapá.
Entre os candidatos que lideram nos estados onde a disputa está mais apertada e deve se decidir no segundo turno, cinco estão alinhados com Lula desde o início do período eleitoral, entre eles Fernando Haddad, em São Paulo, maior colégio eleitoral do país. Os outros quatro aliados de Lula lideram em estados do Nordeste onde o candidato do PT conta com importante vantagem em relação a Bolsonaro.
Eduardo Leite (PSDB-RS) e André Puccinelli (MDB), que lideram a disputa em seus respectivos estados, até o momento não sinalizaram apoio para nenhum candidato em um segundo turno presidencial.
Se o favoritismo dos atuais líderes nas pesquisas se confirmar, Bolsonaro pode garantir no segundo turno o apoio de governadores eleitos em seis estados, incluindo Minas e Rio de Janeiro, contra apenas dois de Lula. Nos cenários mais competitivos, Lula poderá contar com aliados fortes no Nordeste, região na qual ele tem melhor desempenho nas pesquisas.
Marta Mendes da Rocha é professora associada do Departamento de Ciências Sociais da UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora), onde coordena o Nepol (Núcleo de Estudos sobre Política Local). É doutora em ciência política pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pesquisadora do CNPq. Foi pesquisadora visitante na Universidade do Texas em Austin (EUA). Webpage: martamrocha.com
Luciana Santana é professora da UFAL (Universidade Federal de Alagoas) e da UFPI (Universidade Federal do Piauí). Mestre e doutora em ciência política pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), com período sanduíche na Universidade de Salamanca (Espanha). Líder do grupo de pesquisa Instituições, Comportamento político e Democracia e diretora da regional Nordeste da ABCP (Associação Brasileira de Ciência Política).
Gustavo Paravizo é jornalista, mestre e doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Juiz de Fora e pesquisador do Nepol (Núcleo de Estudos sobre Política Local).
por Denise Paiva
Robert Bonifácio e Denise Paiva*
Publicado no GGN
As eleições de 2022 em Goiás estão, até agora, parecidas com o que se apresentava em igual período nas eleições de 2018. Em ambos os contextos: (i) Ronaldo Caiado (antes do DEM, agora no União Brasil), rouba a cena na disputa para governador, deixando os oponentes para trás no primeiro turno; (ii) Bolsonaro encontra-se à frente do candidato petista à Presidência da República e (iii) a polarização nacional não ecoa na disputa eleitoral para governador.
Caiado disparado na frente
Em 2018, a conjuntura estava muito favorável para Caiado. Ele conseguiu dividir o hoje MDB a partir de dois movimentos: promoveu indiretamente uma “guerra” entre o então (e atual) presidente regional do partido, Daniel Vilela, e fortes lideranças locais, como os prefeitos Adib Elias (Catalão) e Renato Castro (Goianésia). Além disso, induziu uma tímida participação de Iris Rezende (1933- 2021), então prefeito de Goiânia, naquela campanha eleitoral. Por fim, Caiado se favoreceu com o desgaste da hegemonia de duas décadas do PSDB estadual e com a prisão preventiva de Marconi Perillo, maior líder regional do partido, às vésperas daquela eleição.
Agora, em 2022, Caiado conseguiu atrair Vilela para ser seu candidato a vice-governador, o que pacifica o MDB e lhe confere mais musculatura política, tanto na capital quanto no interior. O PSDB teve muitas dificuldades e não apresentou uma candidatura a governador. Surgiu um novo oponente ao atual governador, Gustavo Mendanha (antes MDB, agora Patriotas), que tinha boas perspectivas, mas se equivocou por completo na articulação política. Mendanha foi eleito prefeito de Aparecida de Goiânia em 2016 (no primeiro turno) com apoio de Maguito Vilela, a quem sucedeu, e foi reeleito em 2020 no primeiro turno com 98% dos votos válidos. Após discordar de Daniel Vilela (presidente do MDB regional), em função da aliança com Ronaldo Caiado, e por querer concorrer ao executivo estadual, acabou se desfiliando do MDB e filiou-se ao Patriotas para concorrer a governador.
Mendanha foi alvo de uma ação política atabalhoada de Caiado às vésperas da sua reeleição como prefeito do segundo maior colégio eleitoral de Goiás, Aparecida de Goiânia, situada na região metropolitana. O governador acionou o aparato policial e foi até um posto de gasolina acusar Mendanha de comprar votos, mesmo sem ter provas para tanto. Além disso, o ex-prefeito é jovem e poderia se apresentar como novidade na disputa eleitoral. No entanto, seu arco de alianças é modesto, o que não lhe provê recursos financeiros nem tempo de rádio e TV suficientes e tampouco apoios robustos no interior do estado. Para piorar, declarou-se bolsonarista, mas o namoro não foi correspondido: o presidente da República apoia outro candidato a governador, o deputado federal Major Vitor Hugo (PL), seu fiel aliado.
Toda essa conjunção de acontecimentos deixa Caiado, em agosto de 2022 (48%), em situação similar à que estava em setembro de 2018 (47%), considerando resultados de pesquisa de intenção de voto do IBOPE e do IPEC, respectivamente (ver Gráficos 1 e 2 abaixo). Em 2018, Caiado foi eleito em primeiro turno com 59,73% dos votos e, caso a conjuntura não se altere, a eleição deste ano tende a ter um desfecho idêntico ao de 2018.
Gráfico 1 – Intenções de voto para governador de Goiás – Setembro 2018
Gráfico 2 – Intenções de voto para governador de Goiás – Agosto 2022
Fonte: Ipec
Bolsonaro à frente de petistas
É comum em Goiás que candidatos de direita (moderada ou radical) à Presidência da República levem vantagem sobre candidatos petistas. Durante as últimas cinco eleições, candidatos da direita ganharam 6 de 10 turnos em disputa no estado, conforme ilustra a Tabela 1. A maior diferença de votos deu-se na eleição mais recente, o segundo turno de 2018, quando Bolsonaro (então PSL) teve 30% a mais de votos válidos do que Haddad (PT).
Tabela 1 – Resultados eleitorais dos dois primeiros colocados nas eleições presidenciais em Goiás (2002-2018)
|
2002 |
2006 |
2010 |
2014 |
2018 |
|
1º |
2º |
1º |
2º |
1º |
2º |
1º |
2º |
1º |
2º |
PT |
42,1 |
57,1 |
40,1 |
54,8 |
42,2 |
49,3 |
31,6 |
42,4 |
21,9 |
35,5 |
PSDB/PSL |
27,9 |
42,9 |
51,5 |
45,2 |
39,5 |
50,7 |
41,6 |
57,6 |
57,2 |
65,5 |
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)
*Candidatos do PT: Lula em 2002 e 2006; Dilma em 2010 e 2014; Haddad em 2018.
*Candidatos do PSDB: Serra em 2002 e 2010; Alckmin em 2006; Aécio Neves em 2014.
*Candidato do PSL: Bolsonaro em 2018.
Em setembro de 2018, a disputa eleitoral para a Presidência da República em Goiás indicava liderança de Bolsonaro (35%), a segunda posição para Haddad (15%) e grande pulverização de votos entre os demais candidatos (35% no total), conforme mostra o Gráfico 3. A disputa em agosto de 2022 (Gráfico 4) é similar em relação à ordem de predileção dos eleitores goianos: mais uma vez, Bolsonaro (PL) se mostra à frente do candidato petista, alcançando 39% das intenções de voto, ante a 34% de Lula, embora ambos estejam em situação de empate técnico, considerando a margem de erro. Por outro lado, as intenções de voto nos demais candidatos se mostra menor, abarcando somente 13%. Certamente não é possível cravar qual candidato terá mais votos no primeiro turno para presidente em Goiás, ao contrário de 2018, mas o cenário atual guarda relação com aquele de quatro anos atrás.
Gráfico 3 – Intenções de voto para presidente em Goiás – Setembro 2018
Fonte: IBOPE
Gráfico 4 – Intenções de voto para presidente em Goiás – Agosto 2022
Fonte: Ipec
Predomínio da lógica regional na eleição para governador
Um cidadão não tão bem informado ou interessado na política goiana talvez se assuste ao ter contato com as intenções de voto na disputa para governador. É porque ela não segue – há décadas – o mesmo sentido da disputa nacional, ao contrário do que usualmente se observa nos cinco maiores colégios eleitorais do país – São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul.
Em 2022, esse cenário se mostra ainda mais perceptível. Caiado adotou uma postura reticente e não comenta sobre a eleição presidencial. Isso se deve à relação azeda com Bolsonaro, uma vez que este apoia o deputado Major Victor Hugo, e ao fato de que o atual governador divide com Lula boa parte do eleitorado, por incrível que pareça. Logo, falar de eleição presidencial é assunto proibido no Palácio das Esmeraldas. Some-se a isso o fato de o candidato bolsonarista não alcançar sequer dois dígitos e o candidato petista, Wolmir Amado, sequer alcançar 1% de intenção de voto na pesquisa IPEC acima referida.
Durante décadas, a disputa pelo poder executivo estadual gravitou entre PMDB e PSDB. Caiado desconstruiu essa dinâmica de poder em 2018, mas o fez sem alterar uma das lógicas da disputa, isto é, sem adicionar qualquer ingrediente de alcance nacional. Goiás continua olhando somente para si para decidir sobre quem governa o estado.
Robert Bonifácio é doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais e professor da Universidade Federal de Goiás.
Denise Paiva é doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e professora titular aposentada da Universidade Federal de Goiás.
por Daniel Estevão Ramos de Miranda
Daniel Estevão Ramos de Miranda
As eleições de 2022 em Mato Grosso do Sul sofrem a influência do rescaldo do bolsonarismo. O fato mais destacado e inédito é o protagonismo nacional assumido por duas de suas senadoras, ambas candidatas à Presidência da República: Soraya Thronicke (União Brasil) e Simone Tebet (MDB). Eleita na “onda Bolsonaro” de 2018, Thronicke foi progressivamente se afastando do bolsonarismo “puro”, tornando-se, inclusive, crítica do governo federal, e estreitando laços com as lideranças nacionais do PSL, ao mesmo tempo em que firmava sua liderança no diretório estadual daquela sigla, ainda antes da fusão com o DEM. Ela é também a última remanescente dos quatro senadores eleitos pelo PSL em 2018 (Major Olímpio faleceu, Flávio Bolsonaro migrou para o PL e a Juíza Selma perdeu o mandato). Encabeçar a chapa presidencial do novo condomínio partidário que gerou o União Brasil é, portanto, a culminância de sua pragmática estratégia de sobrevivência política pós-bolsonarismo.
Paralelamente, a candidatura presidencial de Simone Tebet também é resultado parcial de decisões visando sobrevivência política diante dos impactos do bolsonarismo, mas por outras vias e circunstâncias. Com sólida carreira política em Mato Grosso do Sul e eleita com votação expressiva para o Senado em 2014, Tebet decidiu não concorrer à reeleição seja para aproveitar a conjuntura favorável resultante da nacionalização de seu nome na esteira da CPI da Covid, seja por ter calculado que provavelmente não se reelegeria senadora diante da força avassaladora acumulada pela ex-ministra do governo Bolsonaro, Tereza Cristina (Progressistas), a terceira mulher protagonista nessa eleição sul-mato-grossense de 2022.
Completando o quadro dessa dimensão mais nacionalizada, Luiz H. Mandetta (União Brasil), também ex-ministro do governo Bolsonaro que ganhou muita visibilidade nacional no início da pandemia de Covid-19, concorre ao Senado, mas com uma candidatura que não ganhou muita tração na medida em que aquela visibilidade se esvaiu rapidamente enquanto capital eleitoral ao mesmo tempo em que Tereza Cristina consolidou sua posição como a candidata de Bolsonaro em um estado onde os partidos mais à direita são historicamente mais fortes.
Dado esse histórico mais conservador e o desempenho de Bolsonaro em 2018, dois candidatos ao governo tentam captar o eleitor bolsonarista: Eduardo Riedel (PSDB) e Capitão Contar (PRTB). Esse último, eleito deputado estadual mais votado em 2018 na onda bolsonarista, seguiu o presidente Bolsonaro quando esse ingressou no PL, supondo ser o candidato “natural” do partido e do bolsonarismo no estado. Contudo, ficou sem espaço quando o PL decidiu não lançar chapa para o governo estadual, apoiando o PSDB. Migrando para o PRTB, Capitão Contar trocou uma reeleição provavelmente fácil para a Assembleia Legislativa de MS por um arriscado movimento de ascensão política na expectativa de que a força do bolsonarismo puro no estado seja suficiente pelo menos para levá-lo ao segundo turno, algo que as pesquisas até o momento não apontam.
Já Eduardo Riedel, ex-secretário de infraestrutura do atual governador Reinaldo Azambuja (PSDB), conta com o apoio do agronegócio (setor econômico mais forte do estado), da máquina do governo, das forças políticas no interior do estado (o PSDB elegeu 45% dos prefeitos de MS em 2020) e do próprio presidente Jair Bolsonaro, que declarou apoio durante sua participação por vídeo-chamada na convenção do PL-MS. Para selar o compromisso, Riedel compõe chapa com Tereza Cristina, cujo suplente é o amigo pessoal de longa data de Jair Bolsonaro, o Tenente Portela.
Contudo, embora as eleições majoritárias (Governo e Senado) em MS sejam marcadas por tais influxos bolsonaristas, o único favoritismo identificado nas pesquisas de intenção de voto até o presente momento é o de Tereza Cristina para o Senado. As eleições para o governo estadual são marcadas pela disputa mais acirrada não apenas deste século, mas provavelmente da história de MS. Colocando em perspectiva histórica, os vencedores de todas as quatro eleições para governador realizadas entre 1982 e 1994 obtiveram sempre mais de 50% dos votos no 1° turno (ou no turno único, antes de 1988). Entre 2002 e 2018, a disputa, mesmo quando intensa, se concentrou em apenas duas grandes candidaturas. A exceção, portanto, foi a eleição de 1998, com três candidatos fortes e competitivos.
Dada essa trajetória, é necessário ressaltar o ineditismo de quatro candidaturas competitivas para o governo de MS em 2022: a de Eduardo Riedel, já indicada acima, a do ex-governador André Puccinelli (MDB), a do ex-prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad (PSD) e a da deputada federal e ex-vice-governadora, Rose Modesto (União Brasil). As pesquisas apontam a liderança de Puccinelli, mas não muito folgada, pois oscila entre 25-30% das intenções. Ele é seguido pelos outros três que, dependendo da pesquisa e das margens de erro, ora estão empatados tecnicamente, ora se distanciam, mas ficam em geral entre 14% e 20% de intenções de voto cada um. Se as intenções de voto do Capitão Contar, que se aproxima dos 10%, crescerem, poderá entrar no páreo. Já as candidaturas de esquerda (Giselle do PT, Adonis do PSOL e Magno do PCO) somadas ficam abaixo dos 5% de intenções de voto.
Os currículos dos quatro candidatos mais competitivos, resumidos muito brevemente acima, apontam outra tendência que marca as eleições de 2022: o fechamento das portas, partidárias e entre o eleitorado, para os outsiders, a valorização da experiência e do profissionalismo político pelos próprios candidatos e, a julgar pelas pesquisas eleitorais, pelos próprios eleitores, majoritariamente. Se, em 2018, o então novato na política Juiz Odilon disputou o segundo turno contra Reinaldo Azambuja, em 2022 não há mais esse espaço, pois mesmo que o maior herdeiro do discurso antipolítica de 2018, Capitão Contar, cresça nas pesquisas, não se trata mais de um novato ou outsider propriamente.
Portanto, as eleições de 2022 parecem ser o marco principal do processo de reorganização das forças políticas e partidárias após o violento choque que a onda bolsonarista produziu. Onda essa que, ao que tudo indica, não deixará muitos herdeiros diretos no estado.
Daniel Estevão Ramos de Miranda é doutor em Ciência Política e professor na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
por Monalisa Torres
Monalisa Torres, Nathanael Rodrigues, Davi Sousa e Lilian Cavalcante*
Foi dada a largada para a corrida ao Palácio da Abolição no Ceará. E após as definições dos partidos, temos os seguintes nomes disputando o cargo de governador e vice, respectivamente: Capitão Wagner (UB) e Raimundo Gomes de Matos (PL); Roberto Cláudio (PDT) e Domingos Filho (PSD); Elmano de Freitas (PT) e Jade Romero (MDB); Zé Batista (PSTU) e Reginaldo Araújo (PSTU); Chico Malta (PCB) e Nauri Araújo (PCB); Serley Leal (UP) e Bita Tapeba (UP). Dessas, as três primeiras candidaturas mostram-se mais competitivas pelo tamanho das coalizões que conseguiram montar e pelos apoios que têm agregado capital político aos seus postulantes.
Aliado do presidente Bolsonaro (PL), Capitão Wagner consolidou-se como o principal nome da oposição no estado do Ceará. Com forte base eleitoral na capital, lidera as pesquisas de intenção de votos e conta com apoio de seis partidos (União Brasil, PL, Avante, Republicanos, PTB, PODEMOS), que em número de prefeituras soma 16 municípios.
Partidário de Ciro Gomes, Roberto Cláudio (PDT), foi prefeito de Fortaleza e conta também com o apoio de Tasso Jereissati (PSDB). Seu candidato a vice, Domingos Filho, é líder do PSD no Ceará, segundo partido em número de prefeituras. Sua coligação reúne nove siglas (PDT, PSD, PSB, PSC, Patriota, PMN, Agir, DC e PMB), que, somadas, administram 95 prefeituras.
Por sua vez, Elmano de Freitas (PT), cujo palanque contará com as presenças de Lula e do ex-governador Camilo Santana, compôs uma aliança com nove partidos (PT, MDB, PV, PSOL, PCdoB, PP, Solidariedade, REDE, PRTB), que somados chegam a 61 prefeituras.
Os primeiros dias de campanha
Os primeiros dias de campanha já ofereceram importantes indicativos das estratégias a serem adotadas pelos candidatos ao executivo estadual cearense: a presença forte na capital, Fortaleza, demonstrando a necessidade de ganhar terreno no maior colégio eleitoral do estado, mas também a busca por apoios dos prefeitos dos municípios do interior.
Observadores das eleições concordam que para um candidato ao governo manter-se competitivo, precisa atingir, no mínimo, 1/3 das intenções de votos na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) para garantir apoio dos prefeitos do interior. Do contrário, corre-se o risco de ver sua base política esvaziar-se.
Aqui cabe uma lembrança: na história recente do Ceará, as eleições majoritárias mais competitivas foram resolvidas conquistando-se os votos das bases eleitorais do interior. Foi assim que, em 2002, Lúcio Alcântara (PSDB) foi eleito governador em segundo turno. Ou em 2014, quando de virada Camilo Santana (PT) conquista seu primeiro mandato para o executivo cearense. Ou ainda, em 2018, quando Eunício Oliveira (MDB) não é reeleito ao senado em virtude de ter perdido parte de sua base eleitoral no interior.
Outra especificidade das eleições cearenses tem sido a vitória de oposições que derivam de rachas nas bases governistas. Para ficar num exemplo mais recente, citamos o caso de Cid Gomes (PSB) em 2006. Na época, Cid deixou a base do governo Lúcio Alcântara (PSDB), que tentou reeleição, para se colocar como alternativa ao ex-aliado. Com apoio informal de Tasso Jereissati (PSDB), Cid Gomes foi eleito governador ainda no primeiro turno das eleições, vencendo em 164 dos 184 municípios cearenses.
As eleições de 2022 parecem repetir os padrões assinalados acima: 1) a atenção dos candidatos para a contrução de rede de apoio nos municípios do interior e 2) candidaturas fortes que nascem da fragmentação da base governista. Ainda que estejamos no início das campanhas eleitorais, esses dois elementos combinados a um fato inédito na política cearense (a declaração de neutralidade da governadora Izolda Cela, atualmente sem partido), têm produzido um cenário de acirramento e incertezas quanto aos nomes que seguirão para o segundo turno na corrida pelo Palácio da Abolição.
O racha da base governista e o reposicionamento das bases eleitorais
No momento da escrita desse artigo, dos 184 prefeitos cearenses, oito afirmaram comprometer-se com o candidato Capitão Wagner. Outros 73 oficializaram apoio a Roberto Cláudio e cem prefeitos declararam-se apoiadores de Elmano de Freitas. Apenas quatro prefeitos ainda não oficializaram apoio a nenhum dos postulantes ao governo, dentre eles o prefeito de Sobral, Ivo Gomes (PDT). Outro dado que chama atenção é que 21 prefeitos de siglas que compõem a base de Roberto Cláudio apoiam a candidatura de Elmano e uma prefeita mudou de legenda (do PSD para o MDB) para declarar apoio ao candidato petista. Essas “infidelidades” também ocorrem do lado de Wagner, que viu cinco prefeitos de partidos coligados apoiarem adversários e outros três que ainda não declararam seu apoio (Figura 1).
Figura 1 – Mapa de apoio – eleições 2022 no Ceará
Fonte: elaboração própria.
Obviamente esses números poderão mudar até a reta final das campanhas eleitorais, sobretudo após o início do horário eleitoral gratuito no rádio e TV. No entanto, cabe fazer um destaque para a fragmentação da base governista após o racha entre PDT e PT (ver em artigo link ) e do papel que lideranças como Domingos Filho (PSD), de um lado, e Eunício Oliveira (MDB) e Camilo Santana (PT), de outro, têm exercido na costura da base política junto aos prefeitos cearenses.
O que as pesquisas indicam?
Nos dois últimos levantamentos de intenção de votos, Wagner permanece na liderança e Roberto Cláudio e Elmano de Freitas aparecem empatados tecnicamente.
Segundo a pesquisa Real Time Big Data, divulgada em 22 de agosto, Wagner apresenta crescimento, de 35% para 38% das intenções de votos. Roberto Cláudio perde 5%, marcando 23% no último levantamento. Elmano sobe de 20% para 24%. Brancos e nulos somaram 7%. Não souberam ou não responderam, 5%.
Na pesquisa IPESPE/O Povo, de 25 de agosto, Wagner oscilou um ponto para baixo, de 38% para 37% das intenções de voto. Roberto Cláudio também oscilou negativamente dentro da margem de erro, aparecendo com 28% no primeiro levantamento e 25% no segundo. Elmano foi o único que apresentou evolução, empatando tecnicamente com o ex-aliado, subindo de 13% para 20% das intenções de votos. Brancos e nulos somaram 10%. Não souberam ou não responderam, 7%.
Até o momento, na disputa pelos espólios da base governista, Camilo Santana parece ter logrado os melhores resultados. É o que indica o mapa de apoio e o crescimento de Elmano nas pesquisas de intenção de votos, sobretudo entre os respondentes do interior do estado. Sem o trabalho de composição do habilidoso senador Cid Gomes (PDT), Roberto Cláudio precisará demonstrar a mesma habilidade que mobilizou na campanha vitoriosa de Sarto Nogueira (PDT) à prefeitura de Fortaleza em 2020.
A eleição de 2022, de partida, já se mostra bastante competitiva. O resultado poderá selar o destino do grupo político dos Ferreira Gomes no Ceará.
*Monalisa Torres é professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará. Doutora em Sociologia pela UFC. Pesquisadora vinculada ao Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (LEPEM-UFC).
Nathanael Rodrigues é aluno de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará. Bolsista IC/UECE vinculado ao projeto “Pactos na cena política cearense: dinâmica de funcionamento de grupos políticos no contexto de transição de ciclos políticos no Ceará”
Davi Sousa é aluno de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará. Bolsista ICT/Funcap vinculado ao projeto “Pactos na cena política cearense: dinâmica de funcionamento de grupos políticos no contexto de transição de ciclos políticos no Ceará”
Lilian Cavalcante é aluna de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará. Pesquisadora voluntária vinculada ao projeto “Pactos na cena política cearense: dinâmica de funcionamento de grupos políticos no contexto de transição de ciclos políticos no Ceará”
por Luci Maria Teston
Luci Maria Teston*
Publicado no Congresso em Foco
Há entendimentos divergentes sobre meio ambiente entre os sete candidatos a governador do Acre em seus planos de governo. Propostas desde zerar o desmatamento ilegal até a necessidade de reformar as consideradas “draconianas” leis ambientais do estado são apresentadas nos documentos.
Como última fronteira a ser incorporada ao sistema econômico dominante, a Amazônia vem se tornando o centro de discussões globais envolvendo o meio ambiente. Parte deste debate relaciona-se aos desafios decorrentes da exploração ilegal de madeira, do avanço da agropecuária e da mineração. Regionalmente, permanece o eterno dilema entre preservação e desenvolvimento econômico.
A poucas semanas para as eleições gerais, o plano dos principais candidatos a governador do Acre foram analisados quanto à inclusão da problemática ambiental, considerando as ações propostas pelos postulantes ao cargo.
Gladson defende regularização ambiental e manejo florestal sustentável
Favorito nas últimas pesquisas, o governador Gladson Cameli (PP), eleito no primeiro turno em 2018 na onda do conservadorismo, busca a reeleição. Disputa os votos bolsonaristas com antigos aliados, os senadores Sérgio Petecão (PSD) e Márcio Bittar (União Brasil), além de Mara Rocha (MDB), deputada federal eleita com o maior percentual de votos nominais no Acre nas últimas eleições.
Em seu plano “Compromissos de governo”, o candidato traz a questão ambiental como eixo estratégico e propõe ações relacionadas à área ambiental, boa parte associada ao ordenamento territorial, regularização ambiental e fundiária. Defende a desburocratização do sistema de licenciamento ambiental e o apoio à expansão da prática de manejo florestal sustentável.
Gladson pretende ainda contribuir para a redução dos impactos ambientais oriundos do descarte de resíduos sólidos, investir em fontes renováveis de energia e atuar de forma integrada com organismos nacionais e internacionais pela redução dos impactos causados pelas mudanças climáticas.
Jorge Viana fala em “agronegócio sustentável”
O ex-governador por dois mandatos, Jorge Viana (PT), tenta retomar o domínio petista no estado. O partido esteve no poder por vinte anos anos, a mais duradoura hegemonia na história política do Acre. É o único dos candidatos competitivos que aglutina os votos dos eleitores lulistas e petistas.
Com maior destaque ao meio ambiente se comparado aos demais, o plano “Compromissos para melhor servir ao povo acreano” inclui somar-se ao esforço mundial contra a crise climática e a retomada de ações de combate ao desmatamento ilegal. Também propõe “reformar os regulamentos e o sistema de licenciamento do manejo florestal madeireiro”, “criar incentivos para restauração e recomposição florestal”, bem como “combater todo e qualquer tipo de grilagem e invasão de terras e contribuir na mediação de conflitos agrários”.
No plano é detalhado o conceito de “agronegócio sustentável” e sugeridos caminhos possíveis para uma agenda de desenvolvimento econômico com foco nas áreas de floresta e de agropecuária. Estes caminhos incluem a “restauração da floresta original” e o aumento das exportações de produtos compatíveis com a sua conservação. Além disso, propõe “aproveitar as oportunidades apresentadas pelos mercados de carbono para as partes da floresta que ainda estão de pé” e sugere criar “oportunidades para aumentar a produtividade agrícola no Acre” para atender a demanda de expansão do agronegócio.
Petecão pretende revisar e implementar plano de combate ao desmatamento
Apesar do tema não constar como um eixo estratégico no plano de governo do candidato do PSD, o senador Sérgio Petecão elenca oito ações relacionadas à agenda ambiental. No documento “Com a Força do Povo” propõe fortalecer a gestão nas unidades de conservação estadual, revisar e implementar o Plano de Gestão de Recursos Hídricos e o Plano de Combate ao Desmatamento e Queimadas Ilegais.
Outras propostas visam criar e fortalecer os programas de regularização de vazios fundiários nas regionais do estado, bem como realizar campanhas educativas de preservação ambiental e de uso consciente da água.
Bittar defende reforma nas “draconianas leis ambientais do estado”
Ao ganhar projeção como relator do Orçamento da União em 2021, o candidato do União Brasil, senador Márcio Bittar, traz em seu plano a defesa do governo federal e tece críticas à forma como foi e é conduzida a política ambiental.
Em “Ordem, Progresso e Competência para fazer”, critica a ideia de intocabilidade da região Amazônica. Dificuldades estariam sendo impostas para “atender interesses estrangeiros, alguns explícitos e outros ocultos, e não permitir que a região seja um celeiro de produção”.
O candidato propõe flexibilizar as leis ambientais para tornar a região um “celeiro de produção” e enfatiza a “loucura que foi a tal da florestania”, conceito elaborado durante o governo de Jorge Viana, que teria obtido resultados para além de “discursos submissos e ofensivos à soberania nacional”.
Também critica a postura do atual governo estadual, enfatizando não haver vontade política nem “coragem para fazer uma reforma, mínima que fosse, nas draconianas leis ambientais do estado. Tudo continuou travado e nada mudou”.
No documento são elencadas três ações pontuais relacionadas à pauta ambiental: “remoção de inibidores à exploração da terra”, “alocar recursos e programas de fomento que destravem a exploração da terra e da própria floresta com o menor dano possível”, além de “recuperar centenas de milhares de hectares de terras degradadas”, incentivando sua exploração.
Perspectivas e desafios para o meio ambiente
Apesar dos dados alarmantes de desmatamentos e queimadas na Amazônia, quando são analisadas percepções do eleitorado da classe C, o tema apresenta-se como secundário em comparação com economia e saúde pública, sendo considerado assunto pouco sensível para esta população.
Não obstante essa percepção, torna-se difícil desconectar o meio ambiente das questões econômicas e sociais. Há importantes relações entre meio ambiente e economia. Também não se pode desconsiderar a conexão com a saúde pública quando se observa o crescimento considerável de doenças respiratórias decorrentes da baixa qualidade do ar em função das queimadas em períodos de seca. Somente no Acre, entre agosto de 2021 e julho deste ano, foram desmatados 865km2, segundo dados do Imazon.
Essa incompreensão em relação ao meio ambiente e sua conexão com a vida das pessoas pode ser uma das respostas às diversas formas como o tema é apresentado no plano de governo dos candidatos.
Uma transformação da ordem estabelecida pressupõe trazer o meio ambiente para o centro das discussões e não como um elemento periférico no debate eleitoral. Enxergá-lo como um tema que permeia e é permeado, influencia e sofre as consequências de decisões em outros campos. A vida das pessoas é afetada pelo meio ambiente, mesmo que elas não se deem conta disso.
*Luci Maria Teston é professora no Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre (UFAC). Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) e mestra em Ciência Política pelo antigo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). Graduada em Direito, em Administração e em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo.
por Ananda Marques
Ananda Marques e Hesaú Rômulo*
Publicado na Revista Nordeste
Os contornos da disputa majoritária no Maranhão estão traçados: uma corrida pelo executivo estadual se acirra carregada de indefinição sobre quem será o novo governador a partir de 2023. As forças políticas que se organizam, tanto a partir de fraturas governistas, como de oposição bolsonarista, enfileiram-se para concorrer pela preferência do eleitorado.
Nesse contexto, algumas perguntas são fundamentais. Primeiro, qual o tamanho da influência de Lula e Bolsonaro no Maranhão? Segundo, como as coalizões eleitorais locais se relacionam com as coalizões eleitorais nacionais? E terceiro, quais as possibilidades futuras para as alianças estabelecidas até aqui entre essas coalizões? A análise que traçamos neste texto diz respeito à formação de palanques eleitorais para a disputa, e seus principais impactos na corrida pelo comando administrativo do estado.
A formação da chapa entre PSB-PT no Maranhão reúne uma coalizão de partidos que espelham a aliança nacional. Este é inclusive o principal trunfo de Carlos Brandão, atual governador, que ativou de maneira integral a figura do ex-presidente Lula, líder nas intenções de voto para o Palácio do Planalto. Além de Lula, Brandão conta com o apoio de outros oito partidos (MDB, PP, PATRIOTA, PODE, PCdoB, PV, PSDB, CIDADANIA) e do seu antecessor, Flávio Dino (PSB), preferido nas pesquisas para o Senado. Brandão lidera em praticamente todas as pesquisas de intenção de voto até aqui, sem no entanto abrir margem segura em relação aos demais colocados.
No segundo lugar, temos uma chapa fruto de rupturas governistas: o senador Weverton Rocha (PDT) montou um palanque com pouca margem para se movimentar dentro do campo progressista. Assim, teve que ajustar seu discurso de campanha para uma concessão de forças conservadoras, como, por exemplo, PTB, PL, REPUBLICANOS, PROS e AGIR. Weverton sustentou a campanha apesar de todos os reveses sofridos no começo do ano e busca algo curioso na política: ser o candidato da continuidade do projeto político de Flávio Dino, derrotando o candidato de Dino em outubro. A estratégia do discurso do pedetista vai precisar investir numa aposta arriscada daqui para frente: capturar eleitores de espectros ideológicos distintos.
Uma candidatura definida recentemente e que pode trazer surpresas para a disputa é a do ex-prefeito de São Luís. Edivaldo (PSD) entrou na corrida com um discurso independente e acumula uma alta aprovação na capital, ainda que não tenha construído alianças pragmáticas para o seu projeto. Junto com o PRTB, Edivaldo tenta mostrar ao eleitorado maranhense que é capaz de ser um bom gestor, ainda que precise capilarizar sua imagem e seu projeto para além dos limites do município de São Luís.
No último bloco, o bolsonarista Lahesio Bonfim (PSC) tenta emplacar um discurso de antipolítica que o coloca hoje com alguma relevância eleitoral (num provável cenário de segundo turno), mas com um teto muito baixo para crescimento. No último levantamento feito pelo IPEC no Maranhão, Bolsonaro teria 18% de intenções de voto, número semelhante ao de Lahesio. Espelhando essas votações, ele tenta projetar as qualidades de um bom gestor, apostando que a experiência de ser prefeito de São Pedro dos Crentes, uma cidade de quase 5 mil habitantes, seja suficiente para um desafio muito maior: administrar um território complexo como o maranhense.
Cada palanque enfrenta seus demônios particulares, explicitando contradições políticas características do período, embora algumas mais agudas que outras. O dilema de ampliação da base de Brandão, com a chegada do MDB e PP, por exemplo, trouxe para o tablado figuras ligadas à oligarquia Sarney, facção política combatida por Flávio Dino ao longo de sua jornada. Algum espectador desavisado pode apontar o dedo para o palanque “olha ali um Sarney”, quando a pergunta a ser feita é mais séria e complexa: “é possível fazer um governo de centro-esquerda com os Sarney?”.
O dilema do palanque de Weverton Rocha, como já mencionamos aqui, é o de sustentar um fôlego progressista em meio a tantos apoios conservadores, sem no entanto ser o candidato favorito de nenhum dos lados. Segundo a mesma pesquisa do IPEC, Lula tem 66% no Maranhão, número mágico tanto para Brandão como para Weverton. Resta saber que estratégia o senador pedetista utilizará para capturar a preferência deste eleitorado, principalmente em virtude das encruzilhadas ideológicas e partidárias que a sua campanha tem pela frente.
Pesando sobre os ombros de Edivaldo, uma tarefa árdua: lutar contra o tempo. É preciso desidratar os concorrentes e crescer, se destacar nos debates e apresentar sua campanha como viável. Avaliamos que o dilema do ex-prefeito acontecerá no segundo turno. Se ele estiver lá, vai em busca de apoio dos bolsonaristas ou vai incorporar à sua campanha forças políticas que hoje ele rejeita? Se não estiver no segundo turno, para onde irão os seus votos? A grande virtude de Edivaldo, esta temperança quase que inequívoca, também pode ser sua maior pedra no sapato. Um dilema parecido vive Lahesio, arauto do conservadorismo maranhense, e sobre o qual já tecemos comentários suficientes.
De modo geral, é importante pontuar que as eleições de 2022 colocam frente a frente forças que durante muito tempo estiveram acomodadas sob uma mesma gramática política, bem ou mal harmonizadas pela batuta do ex-governador Flávio Dino. Com esta reorganização, os atores políticos encontram-se numa disputa ferrenha para consolidar nova hegemonia que, embora não saibamos exatamente qual, será diferente da praticada por Dino.
De modo específico, reposiciona o debate político local sobre os limites da interação entre frações do poder que buscam protagonismo, movimenta a sociedade civil e coloca em xeque o legado de políticas públicas relativamente exitosas, como o investimento em educação, a ampliação da rede hospitalar e o combate exemplar à pandemia.
Em síntese, está em disputa não somente uma competição pelo executivo estadual, mas uma nova fase da política maranhense, regida por novos atores e com uma identidade própria. O arranjo oligárquico, assim como o arranjo que derrotou a oligarquia, ficou no passado. Resta saber o quanto da oligarquia permaneceu nos novos arranjos montados e o quanto de progressismo estará presente nos novos acordos dos postulantes à cadeira de governador.
*Ananda Marques é mestra em Ciência Política pela UFPI.
**Hesaú Rômulo é professor de Ciência Política na UFT e doutorando em Ciência Política na UnB.